sábado, 12 de julho de 2014

COMUNIDADES TRADICIONAIS DE TERREIRO SÃO ALVO DE RECONHECIMENTO E VISIBILIDADE NO MARANHÃO.


COMUNIDADES TRADICIONAIS DE TERREIRO SÃO ALVO DE RECONHECIMENTO E VISIBILIDADE NO MARANHÃO.
Autor: Pai Neto de Azile
Sacerdote Afro-religioso, Geógrafo,
Professor, Ativista de Direitos Humanos
Diretor Geral do Fórum Estadual de Religiões de Matriz Africana do Maranhão - FERMA


O Brasil é um país profundamente marcado pelo racismo. Elemento estruturante da formação social brasileira, fundado na escravidão a que foram submetidos cerca de cinco milhões de africanos e africanas durante mais de 300 anos, entre o início da colonização e meados do século XIX. No período republicano, o racismo foi reforçado, de forma perversa e dissimulada, pelo mito da democracia racial, baseada no elogio à miscigenação e ao branqueamento da população brasileira, postulados pelas elites herdeiras da escravidão desde as primeiras iniciativas de promover a imigração europeia. A República, até bem pouco tempo, ignorou negros e negras como sujeitos de cidadania, mantendo-os na mais completa exclusão social, discriminando suas manifestações culturais e criminalizando qualquer forma de resistência.
Escravidão e racismo estão, portanto, na origem das profundas desigualdades socioeconômicas entre brancos e negros, ainda hoje, passados 120 anos da abolição do sistema escravista. Em face dessa omissão histórica do Estado brasileiro, frente às desigualdades raciais e étnicas, tanto materiais como simbólicas, a cor negra acabou por se estabelecer como um fator de desvantagem na garantia de direitos. De fato, e em que pesem os significativos avanços da Política de Promoção Racial do Brasil nos últimos 15 anos, sobretudo após a Conferência de Durban (2001), ainda há um longo caminho a percorrer para a superação do racismo e a conquista da igualdade racial no país.
Nos últimos anos, inegavelmente, assistimos o Brasil dar um salto qualitativo, pelo menos nos campos jurídico-constitucional e político, visando combater as desigualdades étnico-raciais, em cumprimento aos acordos internacionais assumidos, principalmente, nas questões de combate ao racismo. No centro das discussões encontram-se majoritariamente, segmentos populacionais tidos como minoritários destacando-se os Povos e Comunidades Tradicionais conformem definição do Decreto 6.040/2007 que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais – PNPCT. Conforme concepção adotada pela PNPCT os povos e comunidades tradicionais são “grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição”. Nesse conjunto inserem-se os Povos Tradicionais de Terreiro.
A PNPCT pretende criar condições para a reversão da situação de exclusão social, a preservação da diferença cultural desses grupos, retirando-os da invisibilidade e trazendo-os para o campo dos direitos através do incentivo ao exercício da cidadania como instrumento para o empoderamento desses grupos.
Os Terreiros são espaços sociais de práticas de afro-religiosas, entretanto não são apenas locais de culto, mas também instrumentos de luta contra o preconceito e combate à desigualdade racial. Cabe ainda ressaltar que os terreiros, em sua maioria, estão localizados em áreas de vulnerabilidade social e constituídos por uma população majoritariamente negra. Nesse cenário as casas tradicionais de terreiro, constituem-se, de fato, como territórios tradicionais de comunidades negras, mantendo intensas relações de solidariedade com o seu entorno, desenvolvendo estratégias de enfrentamento coletivo da vulnerabilidade social. Os terreiros tem um potencial transformador, pois são polos de atendimento e de prestação de serviços às comunidades a eles relacionadas.
O Estado do Maranhão, segundo os dados do realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, ocupa a segunda posição de contingente populacional autodeclarada preta e parda do país (Censo de 2010). No Maranhão a expressão religiosa dos negros escravizados é representada pelo Tambor de Mina, pela Umbanda, pelo Terecô, pela Pajelança e pelo Candomblé com pouca ocorrência no Estado. Estima-se que Maranhão conta hoje com cerca de 3.000 (três mil) terreiros, dos quais um terço se concentra na capital São Luis.
Os Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiro representam, atualmente, a memória viva das sociedades tradicionais africanas e salvaguardam a afro descendência brasileira, desde o zelo e respeito pela natureza, base da religiosidade, até a culinária, valores, princípios, hierarquia, língua, estética, indumentárias, etc. Apesar de ter assegurado os seus direitos pela Constituição Federal, os Povos Comunidades Tradicionais de Terreiro devem ter políticas de desenvolvimento diferenciadas por se tratar do mais importante modelo de quilombo vivo da contemporaneidade, guardião da história de resistência daqueles que ajudaram a construir o Brasil.
As questões étnicas, culturais e religiosas de discriminação e exclusão têm perpetuado o genocídio social e cultural implantado pela escravidão. Surge a necessidade de repensar as ações de combate à discriminação, que sejam capazes de, em todas as esferas, cumprir com compromissos assumidos, principalmente nos extratos sociais onde a questão da sobrevivência diária dentro da comunidade faz com que todos realmente se considerem iguais, libertos de discriminação como nos quilombos que independente de suas convicções particulares, dividem a realidade de um coletivo. Essa é a realidade dos Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiros.
No conjunto da sociedade brasileira que ao mesmo tempo exerce o direito constitucional de livre expressão da religiosidade e liberdade de culto, considerando o Brasil um Estado laico, os Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiro vivem a mercê de um massivo projeto de desqualificação, desrespeito, desmoralização, velada ou declarada, por professar seu credo, sua fé, que são à base do seu ordenamento político, social e econômico. A todo o momento, têm-se notícias de situações de agressão e discriminação fragilizando a identidade cultural e étnico-religiosa das comunidades tradicionais de terreiro interferindo na autoestima e no sentido de pertença de um povo. Esse desrespeito histórico aos seus direitos sociais básicos e a falta de acesso às políticas públicas explicam a precariedade das condições de vida em que estas comunidades vivem atualmente. É neste cenário que tem início a construção do 1º Plano Estadual de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana – Povos e Comunidades de Terreiro do Estado do Maranhão (PEPCTMA).
O plano tem como principal objetivo é promover o reconhecimento, fortalecimento, bem como garantir direitos territoriais, sociais, ambientais, econômicos e culturais com base na identidade e nas formas de organização destes povos.
No último dia 10 de julho de 2014,por iniciativa da Secretaria de Estado Extraordinária de Igualdade Racial do Estado do Maranhão – SEIR foi realizada a primeira reunião de trabalho da Comissão de Elaboração do PEPCTMA com a participação de representantes das comunidades: Fórum Estadual de Religiões de Matriz Africana do Maranhão – FERMA, Coletivo de Entidades Negras – CEN, Rede Nacional de Religiões Afro-brasileiras e Saúde – RENAFRO/MA, Fórum Estadual Mulheres de Axé; e de representantes do Poder Público: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, Secretarias de Estado da Educação, Segurança Pública, Direitos Humanos e Cidadania, Desenvolvimento Social e Secretaria Municipal de Saúde. Compõem ainda a Comissão: Federação de Umbanda e Cultos Afro-brasileiros do Maranhão, Secretaria de Estado da Cultura até o momento.
A função dessa Comissão, além de sistematizar o plano recolhera dados mais precisos sobre as comunidades de terreiro de todo o estado do Maranhão. Para professora Claudett Ribeiro, Secretária de Estado Extraordinária de Igualdade Racial “é um momento de realização, pois há muito a SEIR vem tentando implementar esta ação e agora com os parceiros é um fato real” e emocionada manifestou um sentimento de realização. Mãe Luza de Oxum, Coordenadora da RENAFRO NO Maranhão, disse que “a angustia de ver o Estado fora desse processo nacional estava dando sinais que iria reduzir”. Pai Neto de Azile, do FERMA e do CEN ponderou que o Plano, a exemplo do plano nacional, será um instrumento local de luta contra o preconceito e a intolerância religiosa que cerceia direitos civis do povo de santo. A previsão para o lançamento do plano é novembro deste ano durante sendo um marco de operativo de ação pratica para aplicação de políticas públicas para os povos de terreiro, segundo a Secretária de Estado Adjunta de Igualdade Racial do Maranhão Benígna Regina

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