terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

O Meio Ambiente e a tradição afro religiosa: Preservar para Continuar crendo...


A questão ambiental salienta a necessidade de discussão em todos os níveis e dimensões da vida humana. O equilíbrio entre o meio natural e a sociedade é um ponto convergente entre todos os países e nações.
Consiste o meio ambiente em todo espaço apreensível por nossos sentidos. O senso comum formula a idéia que meio ambiente seria um espaço remanescente, alheio a ação antrópica, entretanto é marca indissolúvel da organização do espaço da sociedade. Nessa perspectiva, alguns questionamentos emergem: qual a situação litúrgico-ritualista afro-brasileira contemporânea quanto ao uso do espaço? A essência das religiões de matriz africana é a natureza. Nela se processa a busca do sagrado, do axé. Da manipulação dos elementos naturais extrai-se a força vital para manutenção da tradição. No contexto ecológico atual, é cada vez mais difícil este processo, já que o meio natural se degenera pela imposição da sociedade moderna com sua organização espacial. Perpetuar a tradição pressupõe uso dos elementos do meio natural que contém o axé. Numa visão simplista: água, ar, mata, terra, etc. Manipulando estes elementos há um transporte ao “lócus ancestral” na busca de respostas às questões socioeconômicas, políticas e, principalmente espirituais da modernidade.

Deparamos hoje à nossa volta com a segunda natureza: desmatamento, poluição das águas, perda e envenenamento do solo, expansão urbana, enfim a marca humana sobre a superfície. O espaço vem sendo reelaborado em função do progresso que dista abruptamente a ancestralidade afro-ascendente, impondo adaptações perigosas que levam a dessacralização dos espaços e perda de grande parte da fundamentação ritualística. Através da religião muitos seguidores ressignificam o estilo de vida que possui. A adequação à contemporaneidade é um dos fatores primordiais para que uma religião continue “viva”, sem se prender apenas aos aspectos históricos de outrora ou a ritos tradicionais, sem conexão com o mundo presente.
Certamente, a missão atual da religião não será apenas a de manter ritos e tradições seculares e pregar métodos de cura e doutrinas atemporais sem orientar a conduta dos seguidores sobre questões do cotidiano, como as mudanças climáticas. O destino das religiões que não adequarem os ensinamentos que possuem às necessidades do mundo presente, sem apego a rótulos ou a tradições antigas, deixarão de ser necessárias a humanidade. Esse é o paradigma da religião viva, que “salva no aqui e agora”.

Ao povo do santo cabe a função de solidificar a idéia que todos fazem parte desse ambiente, esta é a fonte do axé e é mister preservá-lo. Os terreiros e demais espaços rituais precisam rever sua posição quanto suas edificações e organizações espaciais, bem como primar pelo manejo sustentável dessa natureza.
Ao entregar oferendas não se deve poluir. Velas votivas devem ocupar lugares que não ofereçam riscos de focos de incêndio. Utensílios não biodegradáveis não devem ser esquecidos (pratos, potes, alguidares) para não contribuir com a destruição da fonte do axé, da energia vital para crença, ou seja, o meio ambiente.
Assistimos hoje a explosão de inúmeras casas novas, espaços rituais, que tratam o espaço natural como algo secundário e até mesmo irrelevante em função dos ditames arquitetônicos das construções urbanas. Isso tem que ser repensado, pois um ditado da tradição afro-descendente diz: “ko si ewe, kosi orisa” – sem folha não há orixá.

Vodunsi Neto de Azile

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