
O Culto às divindades africanas no Brasil é marcada por regionalismos bem com pelo amálgama dos cultos nativos ameríndios e pela tradição católica colonizadora e aculturativa. Os negros estigmatizados com inferiores e áridos de uma religiosidade imposta pelo sistema colonial, ditos não-batizados, os pagãos politeístas, que professavam fé nos elementos da natureza, eram fadados a condição de primitivos bárbaros da visão eurocêntrica. Para fugir da perseguição os escravizados, muito sabiamente, estruturaram um artifício de resistência dissimulando seu culto, sua tradição, através da associação de suas divindades a comemoração de santos católicos do calendário cristão. Assim nasce a religião afro-brasileira. Outro componente estruturante da variedade significativa de modelos de modos de ser e fazer a liturgia afro-religiosa foi o regionalismo. Pelos vários espaços do Brasil - continental a religião afro-brasileira moldou-se em espectros e peculiaridades locacionais – Tambor de Mina, Candomblé, Batuque, Xambá, Terecô, bem como, Cura, Pajelança, Umbanda.
Entre vários rituais e obrigações do Tambor de Mina destaca-se a Ritual para o “Povo da Terra”, Família de Toy Acóssi, Akossu, da Rama/Família (Akó) dos Danbirá. Trata-se de um grande “banquete ritual” em homenagem a aos Voduns desta família como Toy Akossu, Toy Azonsu, Toy Azile, Toy Lepon, Toy Poli Boji, Toy Alogue, Toy Burutoi, Arroeju, Abroju e outros. Diferentemente dos rituais yorubá, nesta festa ritual só se manisfestam os Voduns desta família.
A Família de Danbirá, e seus Voduns, pertencem ao panteon da Terra na Nação Mina do Maranhão. Trazem marcas das doenças e dores do mundo quando ao mesmo tempo oferecem a cura, a transformação. Usam comumente tecidos estampados, guizos. Não usam, azê(capuz de palha da costa) e xaxará (centro ritual de Omulu/Obaluaie). Nos toque do tambor de mina as mulheres usam saias padronizadas de acordo com a cor do vodun/orixá festejado, completado por blusa de renda sempre branca acinturada pela saias (para dentro das saias) o que dos camisus de outras nações ficam por cima das saias rodadas. Não é comum o uso de ojá ou mesmo panos de cabeça, na verdade valoriza-se cabeleira natural, enfeitada com belas fivelas ou pequenas tranças muito discretas, que de acordo com a forma de arrumação diferenciam o sexo e hierarquia no culto. Os homens, sempre de calça branca com bata na cor do Vodun/Orixa do dia conforme a indumentária feminina.



Manifestados os Voduns da família/Clã (Ako) Sakpatá ou Akossu,por isso Akossakpatá, depois de um transe muito sutil, em silêncio, passam a toalha de rechilie ou renda, usam bengala e um lenço vermelho no ombro esquerdo, típico da família. Dançam de forma peculiar com muita senioridade, dança djeje. Cade ressaltar que nas casas de Tambor de Mina nagô estes voduns são hospedes e cultuados de forma muito peculiar.
O banquete ritual anual costuma seguir um calendário cristão, só o calendário. De acordo com o sincretismo – São Sebastião / Vodun Azonce (Azunsn); São Lázaro /Vodun Akossu (o mais velho e doente); Vodun Azile / São Roque. Estes três Voduns comandam toda a família. O banquete é oferecido sobre uma esteira (azan) coberta por grande toalha branca onde as vodunsis pertencentes a “rama”, família, sentam-se ao redor. Trajam roupas rituais e usam seus hunjeves. O ritual ao toque dos batás é iniciado cantando-se uma sequência especial invocando estas divindades e cantando histórias míticas a elas relacionadas, no final rezas em língua ritual mina são entoadas. À proporção que se manifestam são deitados e cobertos por lençóis brancos já que nesse ritual trazem sua essência primordial, sua natureza elementar que não pode ser revelada. Com as divindades presentes são servidos pratos de comida para crianças de um lado e cachorros do outro. Estas comidas são preparadas com a carne dos animais propiciatórios (imolados cerimônias privadas de revitalização do axé). Terminado o “almoço” as crianças são levantadas e os cachorros são retirados é dado um grande banho de pipoca nos presentes onde todo restante dessa obrigação é recolhido e levado ao pegí para ser despachado posteriormente.
Este ritual é suspenso e findado a noite com grande toque de tambor para família. Pode se perceber que a variedade de formas e cultos se multiplica no país. Apesar das diferenças encontramos similitudes. O banquete dos cachorros é um momento de comunhão e humildade. A inocência das crianças pequenas levam a pureza e o inicio do ciclo vital ao ritual, já os cachorros representam a cura das doenças, pois a saliva de suas “lambidas” tem poder asséptico e cicatrizante além de protegerem a asa dos seus donos das doenças que são atraídas para os mesmos.
Professo Neto de Azile. Babalorixá do Tambor de Mina do Maranhão, Geógrafo, Pesquisador de cultura afro-brasileira)
Quem é de axé diz que é! Sou da Mina com Orgulho!